SUPERSTIÇÕES

Logo nos primeiros tempos de Teatro Amador aderi ao ritual mesmo sem perceber muito bem por que é que não se podia dizer "boa sorte" a um actor, nem porque é que as alternativas "parte uma perna" e "muita merda" eram muito bem recebidas.

A verdade é que se disser "boa sorte" a alguém que está a estrear um espectáculo, levo com uma expressão de escândalo que até me sinto mal, como se estivesse a desejar todo o mal do mundo!

Porque toda a gente sabe que dizer "boa sorte" é o equivalente a dizer "azar" - outra palavra proibida!

Mas se não podemos dizer "azar" porque "dá azar", nem "boa sorte" porque também "dá azar", o que é que se pode dizer?

Alguém chegou à conclusão que dizer a uma actor para partir uma perna, mesmo antes de estrear, era muito mais agradável!
Claro que há a outra alternativa, que é a de desejar "Merda!" ... Muito melhor, mesmo!

(Nota: Hoje, tendo em conta o acidente, eu preferia que me tivessem desejado " Muita Merda!", em vez de "Parte uma perna!", mas  como a minha vida tem queda para ser literal, "boa sorte" também não teria sido nada mau!)

Mas se "Boa sorte" dá azar e o "Parte uma perna" dá sorte, e se foi sorte o que me calhou, então vamos lá perceber onde é que ela está! Ainda por cima, agora que parti mesmo a perna, toda a gente me deseja sorte: será que na realidade me desejam azar ou isto funciona mais ou menos como a matemática em que negativo com negativo dá positivo? (Ufa! Até a mim me confundi!)

O melhor é fazer as contas e ver para que lado a balança pesa.

Confesso que os primeiros pensamentos foram pessimistas:

- Sim, parti uma perna e fui operada! Até aqui não me parece que haja nada de agradável.
- Perdi um trabalho, no mês de Natal, fiquei sem a fonte de rendimento que pensava que ia ter nós próximos meses - também não dá para perceber.
- Não consigo conduzir e assim dar assistência à família - também não me parece sorte.
- A minha família fica sobrecarregada com o trabalho e com a assistência que tem de me dar. - também não é fixe.
- A ginástica que tenho de fazer para usar uma casa de banho pública também não é nada agradável! (E poupo-vos a descrição)

Mas também foi cedo que comecei a dar valor a pequenas grandes coisas que não teria se não tivesse tido a sorte de ter o azar de partir a perna:

- Primeiro que tudo, tive a oportunidade de aprender mais sobre as pessoas! E isto fica para a vida.
- Tenho dormido mais, o que andava a desejar há meses!
- Tenho tido tempo para pensar em mim, concentrar-me no essencial...
- Tenho tido mais tempo com os meus filhos e marido (e isto é do mais sortudo que há)
- Tenho recebido mimos -  A minha filha fez-me o almoço, o meu filho tomou pequeno almoço comigo na cama! (E eu adoro mimos!)
- Este Natal, tenho pretexto para não dar prendas: vai ser sem compras nem filas de supermercado!
- Comecei a escrever este Blog! (Isto talvez seja a VOSSA sorte ou azar)
- Comecei a ter tempo para fazer tantas coisas que normalmente ficam por fazer, que me arrisco a ficar com a agenda cheia rapidamente.

Há uma consequência que não consegui decidir em que lista pôr:
- Ganhei um penteado novo!

Talvez ainda venha a perceber o que mais este azar me trouxe de sorte. Talvez ainda venha a descobrir se, por azar, tive sorte, ou se, por sorte, tive azar.

Mas não vou deixar isso ao azar!

Era preciso que eu deixasse que a minha vida fosse tudo só uma questão de sorte!
Só que eu não acredito em superstições, eu acredito no mérito e acredito no trabalho; eu acredito na dedicação e na honestidade; e acima de tudo, acredito no amor e na verdade!